Um rinoceronte caminhava ao lado do carro em que eu estava. É isso mesmo. Devia ter mais de duas toneladas e andava em passos tão lentos quanto um idoso cuidadoso com seu equilíbrio. Estávamos, eu e ele, em uma savana na África do Sul, e deve ter acompanhado o veículo por uns dez minutos.
Às vezes, o bichão parava em frente a um arbusto. E então o motorista também desligava o motor. Tempo para fotografá-lo havia. Mas voltei sem imagem alguma desse gigante e de todos os outros oito que apareceram nos dias seguintes. O motivo não foi maturidade, força de vontade, autocontrole, ou seja lá o que for, para seguir à risca a tal máxima “aproveite o momento sem fotografar”. Assumo. Peguei, sim, o celular e a teleobjetiva para registrar a cena. Afinal, não é todo dia – nem toda década – que um rinoceronte livre segue pelo meu caminho.
Mas, quando eu levantava o telefone e a câmera do colo, em um movimento discreto para não assustar o animal, quatro holandeses, que também eram passageiros do veículo, seguraram a minha mão e afastaram o iPhone como se o pacífico aparelho fosse uma arma letal. Exclamaram um “não faça isso” em um contido volume baixo, embora a intenção de gritar fosse clara. Baixei os “perigosos” aparelhos, e me dispus a “aproveitar o momento” até que me justificassem por que rinocerontes não podem ser estrelas de fotografias.
Assim que o animal desapareceu aos poucos entre os arbustos, com os mesmos passos arrastados e pesados do início, Willem, o motorista, encostou o carro em um ponto sem rinocerontes – e sem elefantes, leões ou girafas – para que a atenção fosse toda dele. Veio então a explicação: 1.028 rinocerontes foram mortos em 2017, ou, para economizar seu tempo na calculadora, quase três por dia durante o ano (atualização: em 2018 foram 769 os rinocerontes mortos, mas ainda assim são pelo menos dois rinocerontes a cada dia).
1.028 rinocerontes foram mortos em 2017, ou, para economizar seu tempo na calculadora, quase três por dia durante o ano. Em 2007, eram “apenas”13 os rinocerontes mortos
Mais um número só para deixar claro que a situação é crítica: em 2007, eram “apenas” 13 os rinocerontes mortos em todo o país. Caçadores tentam todos os dias invadir reservas sul-africanas para retirar o chifre do animal, vendido por até US$ 250 mil – é ostentação para ricaços e remédio afrodisíaco para idiotas. “Por isso não se deve publicar fotos de rinocerontes em redes sociais. Caçadores ficam sabendo da localização, entram na propriedade e atiram contra o bicho”, explicou Willem.
Ele já preparava a chave para dar partida no veículo novamente, quando, ainda intrigada, o interrompi para mais uma pergunta. “Espera. De que forma o chifre de rinoceronte é consumido como remédio?”, questionei, surpresa com a minha própria curiosidade. No dia a dia em São Paulo, as dúvidas que vão e vêm são o horário do trânsito, o saldo da conta, as multas, a chuva que está por vir… mas chifres de rinocerontes pela primeira vez ocupavam os meus pensamentos. “Os homens compram o pó em cápsulas ou raspam o chifre e consomem com uísque. Acreditam que dessa forma o sexo durará tanto quanto o do animal: uma hora. Já podemos partir para ver mais rinocerontes?”. Seguimos.
Avistei um rinoceronte dormindo ao redor de um lago, dois passeando como mãe e filha lado a lado, três se refrescando em uma poça… Voltei sem foto alguma desses bichos. A recordação, entretanto, está lá em casa. Uma garrafa de água, decorada com desenhos do animal, e a etiqueta “save the rhinos”. O valor arrecadado seria doado a um fundo de preservação dos rinocerontes. Algumas lembranças valem muito mais do que uma foto. E, certamente, mais do que chifres de rinocerontes.
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